Estava difícil manter-me concentrado na sala de aula. Eu não conseguia focar apenas no que devia, o som da voz do professor e dos colegas em volta pareciam ruídos. Tentei inspirar e expirar para que me acalmasse, mas não resultava. Levantei! E enquanto marcava passos em direcção a saída o professor chamou por mim, ignorei totalmente, foi o meu primeiro impulso. Andando no corredor da universidade em direcção ao WC, senti meus batimentos cardíacos acelerando, entrei logo na primeira sala de aula vazia para poder recuperar o fôlego e normalizar o batimento cardíaco. Tão logo sentei, tentei retirar o telefone do bolso da calça para ligar para o meu irmão, mas o telefone caiu. Minhas mãos estavam trémulas e o batimento cardíaco não diminuía, apenas fiquei lá sentado por alguns minutos tentando me recompor. Quando finalmente pude apanhar o telefone, disquei o número da minha mãe. Ela não atendia. Apertei o telefone com tanta força, tentando liberar a raiva que eu sentia de mim mesmo. Eu continuava a dizer para mim mesmo que estava tudo bem, mas eu sabia que era mentira, e das maiores mentiras que um ser humano pode contar, é mentir para si mesmo e não aos outros. Trêmulo, eu mal consegui pegar o livro " Crise na Casa dos 20", aquela merda era uma cura tanto quanto uma revelação do que eu estava a sentir. Tive um grande susto quando o telefone vibrou na minha mão. Era a minha mãe retornando a chamada, hesitei em atender, mas ao mesmo tempo algo dentro de mim sussurrava que a única pessoa que entenderia o porquê de eu não querer fazer parte desse mundo seria a mesma pessoa que com dores me colocou nele. Atendi e permaneci em silêncio, ganhando coragem de dizer o que estava sentindo sem desabar.
- Meu filho! - disse ela transbordando uma alegria que se percebia mesmo do outro lado da linha
- Mãe! Mãe! Por que só eu que não dou certo? Por que só eu me sinto assim? Perdido, atrás e sem conquistas para ao menos poder me gabar?
- Meu filho! O que houve? Que pensamentos são esses?
Dei por mim deixando escorrer uma lágrima pelo rosto abaixo.
- Meu filho! Onde estás? Diga onde estás que eu vou ao seu encontro.
- Não respondeste as minhas perguntas, mãe! Ninguém consegue responder por que eu não tenho progredido na vida.. - retruquei soluçando e ainda com lágrimas nós olhos.
- Se acalme! Mas é claro que tens progredido, pode não ser do jeito que você deseja, mas é um progresso. Por que estás a te cobrar tanto?
- Que progresso? Que progresso? - gritei desesperadamente.
- Calma, filho, por favor! - ela levantou o tom da voz, mas sem parecer ameaçador.- O que te faz pensar que não estás a progredir?
- Mãe! Isso é óbvio. Olha para o que os jovens da minha idade já conquistaram. Olha como eles orgulham suas famílias. Olha como eles ajudam suas famílias. Como eu tenho te ajudado?
- Você foi o maior presente que Deus me deu. E não...
- Não me fale de Deus, mãe! - interrompi com raiva. - Deus me abandonou.
- Nunca mais repita isso. Deus nunca sai do nosso lado.
- Mas ele saiu do meu! E se é que ainda está realmente do meu lado por que ele não me responde? - falei baixinho chorando.
- Filho! Para de se punir! Me diz onde estás. - a voz dela ecoou na sala, a chamada estava no altifalante e sua voz estava bem audível.
- Me diz algo, mãe! Tirando o facto de eu ser o maior presente que Deus te deu, eu te deixo orgulhoso?
- Você é meu único filho! Nada no mundo me deixa mais orgulhosa, e nada no mundo me deixa mais triste do que isso, saber que é assim que você se sente.
- Me desculpa! Me desculpa por não ser o filho que você gostaria. Me desculpa por não ainda conseguir ser como os outros que têm conquistado grandes coisas. Mas eu tenho tentado o máximo que possível e fracassado a toda vez que tento.
- Nunca peça desculpas por dares o melhor de si! Eu não já não te ensinei isso? - ela replicou me repreendendo quase que gritando. - Ainda que para os outros não valha nada ou não tenha sido o suficiente, mas se for o melhor si não peça desculpas, faça de novo e ultrapasse os teus limites. Se ainda assim não servir repita o processo de maneiras diferentes até conseguires.
Após o uma breve pausa ela prosseguiu dizendo.
- Eu não devo nada a ninguém! Não fiz mal algum que eu tenha que pagar! Ninguém carrega um ódio por mim que seja justo, por algum mal que causei. Então não há mal algum ou força negativa que descende de mim para ti. Por tudo de bom que eu tenho feito, você como meu único filho também herdará essa benção. A vida é dura! Os fracos vivem reclamando e os fortes vivem as conquistas das quais os fracos reclamam. E eu e o teu pai não criamos um fraco, não permito que você haja assim.
A chamada caiu. De bruços, eu já não conseguia dizer palavra alguma, apenas fiquei em lágrimas sob uma angústia apertando meu coração. Eu passei as mãos no rosto e inclinei tentando me conter.
Mal levantei a cabeça e percebi que não estava sozinho na sala de aula. E com um milhão de pessoas para estar ali, o mundo trouxe logo aquela maldita mulher, a mulher por quem eu estava apaixonado. Pareceu que ela estava a ouvir tudo, minhas lágrimas caíram ainda mais, não entendi se era a maldita vergonha ou mesmo o sentimento que já estava a flor da pele. Ela veio se aproximando a mim e baixei a cabeça sem conseguir sequer olhar para o rosto dela. Era uma certeza que após aquela cena eu com certeza já não tinha mais nenhuma chance com ela. Ela se aproximou sem dizer uma só palavra e sentou bem ao meu lado. Minha mãe tornou a ligar, ela atendeu por mim. Minha mãe falou coisas que eu não queria ouvir e em suas últimas palavras disse que queria me ver vivo e jantando em casa dela no final do dia. A mulher ao meu amor lado quebrou o seu silêncio se dirigindo para mim: "Que o senhor te dê serenidade para aceitar as coisas que não podes mudar. Coragem para mudares aquelas que podes. E sabedoria para entenderes a diferença." Abraçou-me e ficamos ali na companhia um do outro sem dizer nada. Acredita! Aquele foi o silêncio que mais falou na minha vida.
Todos juntos na luta contra a depressão!
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